terça-feira, 22 de dezembro de 2020

O Décimo Segundo Encontro

A vida de Tereza seguia uma normalidade e fluidez incríveis, seu novo atelier montado no cômodo contíguo estava a pleno vapor, uma vez por semana fazia um pequeno quadro, coisas simples para apurar suas técnicas e treinar as aulas online, na qual havia se inscrito.

Lá fora o mundo andava meio louco com o surto de um vírus letal, pessoas morrendo, sobreviventes abalados usando máscaras para se protegerem, uma imensa desordem física e estrutural, no qual Tereza procurava manter sua normalidade, fazendo as coisas que mais gostava e economizando horrores para que o dinheiro que receberá do antigo emprego, mais economias que fizera durante os anos rende-se mais. Enfim, vivia seu novo sonho. E por falar em sonhos, como será que andava Jesus em meio àquela loucura toda?

Tereza se alto congelou e sua mente flui por vários pensamentos, pensou na possibilidade de ajudar Jesus e aproveitar todo o seu talento. Mais como? Pensou... pensou... Talvez alguém de fora. Talvez Dr. Alberto, quem sabe

Quando deu por si, estava com o telefone na mão, marcando uma nova consulta. No outro dia pela tarde (queria ser a última consulta do dia, para ter mais tempo com o Dr.) já estava na recepção do prédio. A recepcionista olhou fixamente para ela e deu um sorriso.

__Ah!!! Você voltou. Quase todas voltam. Porém você está bem diferente heim. Cá entre nós, eu também marquei uma consultinha lá com o Sr, Alberto. E adorei!!!

Novo sorriso da atendente, ela colocou o dedo indicador sobre os lábios, em sinal de silêncio. Seria o pequeno segredinho entre ela e a recepcionista. Ela lhe sorriu de volta retribuindo o mesmo sinal.

Ao chegar no consulto aguardou na sala de espera, em minutos o Dr. apareceu na porta do consultório e a fitou longamente.

__Tereza?

__Sim essa sou eu (risos)

__Pode entrar

Tereza se sentou na confortável cadeira de paciente, Alberto sentou-se na cadeira logo a frente, ainda a fitava.

__Curioso!!!

__Quem??? Eu???

__Sim, sim você teve uma bela transformação. Deve ter seguido minha receita (risos)

__Ao pé da letra (mais risos)

__Bom, então vamos lá. Me conte como tem encarado seus fantasmas, ainda mais em um momento destes que estamos vivendo?

__Na verdadeeeee...

__Sim?

Tereza piscou um olho

__Minha vinda aqui não é na verdade uma consulta

__Ahhhh, então de que se trata?

__Bom vamos ao começo! Eu não conheço muitas pessoas, sai do antigo emprego, estou tentando algo novo, pintura

__Olha, isso é uma coisa excelente!

__E me lembrei do Dr.

__Olha pode me chamar de Alberto

__Ah sim! Então pensei...

__Sim?

__Que o senhor deve conhecer um bocado de gente?

__Ah! Claro. E você gostaria que indicasse alguns, para você vender quadros. Acertei?

Tereza arregalou os olhos

__Não, não é nada disso (risos)

__Puxa errei feio então

__Não chegou nem perto

__Então vou encerrar minha carreira de adivinho e deixar você terminar

__Veja bem, você pode até achar estranho... Já faz um tempo, em nossa última consulta, quando sai daqui eu conheci um rapaz. Um morador de rua. Conversamos um pouco, levei ele para comer algo

__Que linda atitude!

__Ah sim, obrigada. Então este rapaz me mostrou uns textos e vi que ele tem um talento enorme para escrita, decidi ajuda-lo. Mais não sei por onde, não conheço ninguém deste círculo intelectual. Ai pensei... Sei lá... De repente o Dr... Quero dizer, você. Conheça alguém que possa fazer este encaminhamento e ajudar este rapaz?

__Puxa que incrível. Eu conheço sim, pelo menos duas pessoas

__Veja eu trouxe um texto dele que ficou comigo

Alberto pegou a folha da mão de Tereza e leu umas três vezes

__Realmente muito bom! Teria mais?

__Na verdade não

__Uma pena. E onde achamos este rapaz?

Tereza arregalou os olhos novamente!

__Nossa eu sou uma tola né? Vim aqui te incomodar em seu serviço, e nem sei onde localizar esta pessoa. Na última vez eu encontrei ele aqui na praça em frente ao prédio

__Perfeito, então vamos lá. Se for este o destino, o rapaz nos aguarda. E urge encontra-lo de imediato

Alberto arrumou o consultório, trancou a porta e desceram pelo elevador. Ao descerem no térreo Tereza enroscou seu braço no de Alberto, este lhe sorriu. Ao passarem pela recepção Tereza deu uma leve piscadela para a recepcionista, que lhe olhou atônita, mais logo lhe sorriu largamente.

Quando chegaram a praça Tereza foi direto ao banco onde havia encontrado ele pela primeira vez, mais sem sucesso, então resolveram fazer um pequeno passeio de reconhecimento e busca, mais depois de uma hora e meia não obtiveram sucesso algum. Alberto teve a ideia de se separarem eu perguntarem aos mendigos locais, Tereza atendeu prontamente a ideia dirigindo se para o lado direito enquanto Alberto seguiu para esquerda. Depois de mais de duas horas já haviam se encontrado novamente no ponto inicial se que nenhum dos dois tivesse obtido a mínima informação. Tereza se lamentou por ter esperado tanto tempo então sentaram se no banco, foi então que a barriga de Tereza roncou em alto som, ela corou

__Ok moçinha, já estamos andando a um bom tempo, então chegou a hora de abastecer

__Excelente ideia!

__Vamos comer no lugar mais chique desta praça. Eu te prometo

Aberto levantou-se tomou a mão de Tereza e deram três passos

__Pronto chegamos!

Tereza deu uma sonora gargalhada, estavam de frente a uma dessas dezenas de carrinhos de cachorro quente que ficavam espalhadas pela praça

__Ah!!! Isso sim é muitooooooooooo chique!!! Por favor quero um cachorro quente duplo e mais um refrigerante, por favor.

__Pois não mocinha, fique à vontade e sentem-se por favor enquanto vou preparando

O senhor do carrinho de lanches parecia um velhinho bem simpático, enquanto preparava os lanches cantarolava uma cantiga. Tereza teve um clique nesse momento

__Espere, espere. Senhor onde aprendeu essa música? Ela não é assim muito comum

__Verdade, você tem razão no que diz. Mais de tanto ouvir um mendigo cantarolando ela eu meio que peguei de cabeça. E não é que é uma bela melodia (um sorriso)

__E como se chama esse mendigo?

__É o Jesus. Ele é o mais pacato e calmo mendigo desta praça

Tereza não podia se conter em sua felicidade

__Olha estamos procurando ele a horas. Mais pelo que vi pouco o conhecem, e os que o conhecem não tem notícia alguma

__Sim é verdade praticamente ninguém sabe o que aconteceu com Jesus. A não ser uma pessoa

__E quem seria essa pessoa? (perguntou Alberto)

__Eu!

Tereza aflita disparou em seguida

__E onde ele está?

__Infelizmente, internado em hospital. Certa manhã quando cheguei para trabalhar notei que Jesus respirava com dificuldades, até pensei que tinha contraído esse vírus que se espalhou por todo canto. Mais ao leva-lo ao hospital, constataram que o pobre estava com começo de pneumonia, no entanto, nem se assustaram, por ser uma doença muito frequente nos moradores de rua. Noites e mais noites ao relento, períodos de inverno, mais cedo ou mais tarde isso iria acontecer. E vou fazer visita para ele a cada dois dias, se quiserem eu dou o endereço do Hospital e vocês podem ir lá diretamente ver como ele está.

O Senhor anotou o endereço e nome do Hospital em um guardanapo. Alberto pagou os lanches. Depois Tereza e seu amigo se dirigiram ao Hospital local

sexta-feira, 13 de novembro de 2020

O Décimo Primeiro Encontro

Tereza acordou de um sobressalto

Ainda esfregando o olho apanhou o celular e atendeu

Na verdade, não disse nada, seu coração batia aceleradamente por conta do pesadelo que tivera e ainda tentava absorvê-lo.

Do outro lado da linha uma respiração profunda!!!

Houve um tempo de um minuto em que nada, absolutamente nada acontecia, o mutismo de Tereza contrastava fortemente com a respiração do outro lado, e isso meio que pareceu uma eternidade, o que dava impressão de que ela estava entre um mundo real e o imaginário. Estaria realmente acordada??? Ou estava dentro de um sonho dentro de outro???

Finalmente a pessoa do outro lado da linha resolveu se manifestar

__Ah!!! É você!!!

Respondeu Tereza secamente, a pessoa do outro lado da linha falava atabalhoadamente

__Caríssimo, respira um pouco e fala pausadamente, pois não entendi absolutamente nada do que você falou. E outra, acabei de acordar agora, e não muito bem por sinal!!! Não prefere me ligar mais tarde

Mais conjecturas...

__Hum... Ok!!!

Do outro lado da linha a pessoa começou a chorar copiosamente aos soluços, Tereza pensou consigo mesma: Que tédio!!!

__Ok, ok também não é para tanto, não é??? O mundo não acabou!!!

A pessoa fala...

__Sei, sei. Eu entendo!!!

Mais soluços, mais explicações...

__Aham!!! Olha, vou lhe falar o que penso disso...

A pessoa lhe interrompe abruptamente

__Tá bom, tá bom. Te encontro no lugar marcado hoje à tarde, lá pelas 14 horas, pode ser???

A pessoa se senti aliviada, se despede, encerra a ligação

__Ah sim isso é realmente o fim da picada!!!

Tereza se levanta, esta nua, sua silhueta vaga pelo quarto escuro, parece estar perdida. Vai até a porta do quarto, retorna, pensa... Abre a gaveta da cômoda e separa umas roupas, escolhe um tênis descolado (ela anda pelo quarto na escuridão, sabe perfeitamente onde esta cada coisa como se tudo estivesse claro, é seu pequeno mundo!!! Desde de crianças Tereza tinha essa habilidade estranha, de memorizar onde está tudo, era como um jogo, e sua mãe brigava sempre com ela - Tereza pare com isso!!! Uma hora você vai cair, tropeçar em algo, bater com a cara na porta. Mais não isso nunca acontecera – agora ela sorria lembrando-se disso. Teve então uma ideia de ampliar essa habilidade pela casa toda (deu uma sonora gargalhada).

No chuveiro Tereza abriu ele e deixou a água lhe cair sobre a cabeça (gostava sempre de uma temperatura tórrida). Ali ela meditava várias coisas sobre sua existência e sobre o mundo, era como um mantra interno, se dava alguns minutos consigo mesma. Só depois pegava o shampoo e lavava seus cabelos por um bom tempo, eles eram logos e negros. Depois pegava o sabonete esfregava na esponja de banho e passava ela suavemente por sua pele, começava pelo pescoço, deslizando pelos braços tal como uma dança ela voltava pelo mesmo caminho e encontrava seus seios, tudo isso ao som de Mary Carey que saia de seu celular, e ela acompanhando o ritmo, olhos fechados, a esponja descendo seu ventre e indo encontrar suas particularidades mais profundas!!! Então ela finaliza o rito em suas longas pernas, um enxague final e desliga o chuveiro. O banheiro é puro vapor d’agua, vai até o espelho e escreve: ALQUIMIA!!!

Voltou ao quarto para se trocar, lembrou do sonho e fez um paralelo com a ligação que recebera. Seriam os sonhos um pressagio??? No sonho ela foi a um encontro em um lugar bizarro onde as coisas foram se desenrolando até um final fatídico. Suspirou profundamente e pensou: o que tiver que ser, será!!!

As horas realmente voaram, desde a manhã de hoje. Agora ela estava sentada na praça de alimentação do shopping comendo um salgado e tomando um café, aguardando aquela figura estranha que fora seu namorado, ele sempre tão pontual estava uma hora atrasado, chegou apressado, parecia que fugia de alguém, parecia mais gordo e abatido

Lhe deu um beijo na face e sentou-se na sua frente

__Desculpe o atraso viu, foi o transito

__Ah sim, sempre o transito (Tereza sorriu)

__Mais é verdade!!! Juro!!!

__Ok, não precisa jurar, eu acredito, mesmo porque se não for isso, não vai fazer a menor diferença

Tereza mantinha aquele sorriso, parecia que o feria profundamente, ele engoliu seco

__Bom eu não quis falar pelo telefone, mais a verdade é que queria lhe pedir desculpas pessoalmente, acho que devo isso a você

__Olha, você não me deve nadinha rs

__Devo sim!!! A você, as pessoas, ao mundo. Hoje vejo que nunca fui uma boa pessoa, pois estava sempre preocupando comigo mesmo. E obrigava os outros a serem como eu queira, e fazer o que eu queria

__Olha, só de você pensar assim já é uma grande evolução de sua pessoa...

__Tereza... Eu vou morrer!!!

Ela arregalou os olhos, ele pegou em suas mãos

__Cara deixa de besteiras...

__É verdade, o médico disse. Tenho um ano ou dois

Silêncio...

Olhares...

O mundo naquele instante se resumiu a eles dois, e aquele imenso e lotado parque de alimentações parecia estar vazio e extremamente silencioso

Tereza se levantou, deu a volta e lhe deu um forte abraço por trás. Aquele homem que ela conhecerá antes tinha ido embora realmente, uma pessoa grosseira e má, que ria das desgraças dos outros, que impunha até mesmo a roupa que ela devia vestir. Agora ali, diante dela estava um ser humano carente e se sentindo só. Ela se aproximou de seu ouvido e lhe disse baixinho:

__Eu te amo!!!

Sentiu o corpo dele estremecer todinho, achou até que ele iria se desmanchar naquele exato momento. Ele se levantou, ficaram frente a frente e se abraçaram por um longo tempo. Lagrimas correram pelos olhos de ambos

__Olha cara, só vou te dizer uma coisa. Nada é definitivo, pois o Pai sempre dará a palavra final. Lute, simplesmente lute apesar dos diagnósticos e estatísticas. Os médicos estão aí para isso, nos dar dados frios e exatos. Mais o amor do Pai vai muito além de números, pois ele é o dono de todos os números existentes.

Ele lhe sorriu de volta. Ela percebeu que conseguira atingir seu coração e conseguiu arrancar dele um sorriso sincero

__É verdade Tereza, como você é maravilhosa, eu não havia em momento algum pensado nesta possibilidade e você realmente me deu uma esperança que antes não tinha. Sim, eu vou me cuidar. Tanto por dentro, como por fora!!!

__Olha eu estou disponível para acompanhar você em consultas e sessões de tratamento

Ele balançou a cabeça afirmativamente e agradeceu. Naquele momento nascia um novo tipo de amor. Um amor que não era de um casal, que não era de homem e mulher, mais sim o amor entre dois seres humanos, entre duas almas, uma que estava em progresso e outra que despertara de sua própria escuridão


sexta-feira, 16 de outubro de 2020

O Décimo Encontro

Tereza tinha ido à uma velha construção abandonada que existia em sua rua para encontrar uma pessoa desconhecida que havia lhe enviado uma carta anônima que fora colocada por baixo da porta de sua casa. O texto era simples, dizia apenas, vá a este endereço pois tenho uma revelação a lhe fazer, assinado: alguém que lhe quer bem.

A casa era sinistra desde a fachada. O portão velho e todo enferrujado fez um estrondoso ruído assim que ela forçou ele para abri. Era um sobrado antigo da década de cinquenta. Existia uma história sinistra que contava que ali houveram vários assassinatos em série e por este motivo a casa não foi passada para frente, além de estar envolvida em vários processos entre herdeiros. 

Tereza adentrou o que antes era um lindo jardim, mais agora imperavam folhas secas, teias de aranha, árvores enormes, bizarras e ressequidas pelo tempo que impedia a luz do sol de adentrar naquele ambiente

Tereza desde de sua metamorfose não tinha mais sentido medo de nada nesta vida. No entanto aquele local lhe causa um sentimento negativo, tristeza, asco. Uma vontade imensa lhe invadiu de estar bem longe dali, no entanto sua curiosidade era maior. Olhou no entorno para ver se via alguém

Foi contornando a casa, até dar nos fundos e chegou até a antiga piscina, ouviu um choro de criança que vinha lá de dentro. Chegou na borda para dar uma olhada, mais nada viu, além de folhas secas e vários insetos. Dizia a lenda que o filho do último casal morador na casa tinha se afogado ali, era uma criança de apenas oito anos. Por um instante Tereza imagino a agonia da criança tentando sobreviver sobre o turbilhão de águas que lhe invadiam as entranhas junto com uma vontade enorme de poder gritar para que alguém viesse lhe salvar, no entanto, os pais estavam muito preocupados em saber qual investimento fariam para aumentarem seus ganhos na bolsa de valores...

Ali também existia uma churrasqueira de alvenaria, Tereza viu muita gente rindo alto, comendo e bebendo, homens e mulheres de roupa de banho...

Continuou contornando a casa pelo outro lado onde existia um corredor enorme ao que dava entender que ali era a entrada de carros da casa, pois no fundo, paralelo a piscina havia um amplo espaço do que antes era uma cobertura para carros, ainda estava ali um deles totalmente corroído pelo tempo, assim como seu último morado, que após o suicídio de sua esposa (pois não suportou a morte da criança) enlouqueceu e foi internado em um manicômio. Tereza pensou nesse momento em como a vida era frágil e as vezes dramática, pois apesar de toda aquela riqueza, aqueles que nessa imensa casa moraram não conseguiram ser felizes e usufruir de tudo aquilo que possuíam. Como pode isso, as vezes quem pouco tem, é tão feliz e vive-se uma vida tão plena!!!

Tereza acabou saindo novamente na frente da casa, e nada de encontrar viva alma, deveria entrar???

Fico ali parada olhando para o alto, aquela imensidão de casa. Lembrou também de filmes e séries de suspense que coisas desse tipo nunca acabavam bem. Afinal ela nem sabia que a havia arrastado aquele lugar. Tomou se de coragem e pressionou a porta de entrada, que rangeu como um gemido, seus pelos se irisaram e um arrepio tomou todo seu corpo

Deu de cara com a sala, era gigantesca e cheia de móveis comidas pelos cupins, de frente havia uma escada que estava deteriorada, o chão era de madeira e conforme ela pisava sobre ele, o mesmo ia fazendo estalos horríveis. Chegou a cozinha, alia uma grande pia e uma torneira que gotejava água, na parede um armário ainda guardava louças de porcelana no estilo Francês. No canto havia uma porta com um pequeno corredor, que ia dar no quarto da empregada (a mesma que encontrará o menino morto na piscina)

Tereza voltou a sala e ponderou se deveria subir as escadas. A casa era uma escuridão total, olhou no celular já eram quase seis horas, não seria uma boa ideia estar ali quando o breu da noite tomasse conta de tudo. Deu passos rápido e subiu a escada, tomou o rumo a direita, no fundo estava o quarto do casal, cortinas corroídas por traças, a cama tinha cedido uma perna estava torta, o guarda-roupas era embutido na parede com lindos detalhes de entalhes, no chão ainda estava lá um lindo tapete persa resistindo a tudo isso, quase impossível. Ela voltou do lado um quarto de hospedes com uma cama de solteiro e outra de casal, mais a frente perto da escada mais um quarto, também todo mobiliado, no entanto tinham tons femininos. Tereza avançou até o último quarto na direção oposta, estranhamente era o único que estava com a porta trancada, tentou forçar para ver se abria, quando nesse instante ouviu bater da sala. Seu coração saltou e acelerou abruptamente.

Voltou vagarosamente e olhou para baixo, conseguiu ver um homem enorme que estava com um casaco e um capuz sobre a cabeça (estranho pois era uma tarde muito quente). O homem colocou a mão na parte de trás da cintura e sacou uma arma

Tereza teve muito medo nessa hora, se arrependendo imensamente de estar ali naquele lugar, pegou o celular para pedir ajuda e viu que a carga da bateria estava por um fio e piscando, ou seja, tinha segundos para ligar para alguém. Mais seu pavor maior, for perceber que estava sem sinal nenhum

Começou a ouvir o som da pessoa subindo as escadas, então ela se arrastou para o outro lado, tentando não ser detectada e foi até o quarto do casal, abriu as janelas e botou o celular para fora. Enfim, deu sinal!!! Fez a ligação para um nove zero, a bateria acabando... e som dos toques da chamada lhe batendo ao ouvindo, tum, tum, tum

Tereza começou a chorar copiosamente, tum, tum, tum...

Olhou para o lado repentinamente...

Estava na sua cama...

Seu celular tocava, tum, tum, tum...

sexta-feira, 11 de setembro de 2020

O Nono Encontro


Tereza com certeza estava bem mais leve

A cada atitude sua, seu mundo ia se transformando

E um novo vislumbrando a sua porta...

Estava no avião procurando o número de seu assento

Colocou a bagagem de mão na parte superior

Quando ligeiramente olhou para a sua companhia de viagem

O rapaz que estava sentado olhou para ela e deu um sorriso

Tereza sentiu um forte calor, com certeza havia corado

Tentou disfarçar, mais já era tarde

O rapaz no assento era alto, um tipo atlético

Negro, com a barba levemente por fazer

Porém, trabalhada na lamina, fazia um desenho geométrico

Exalava um perfume deliciosíssimo

Que mexeu com a libido de Tereza

Assim que ela se sentou, ele se apresentou

__Olá, meu nome é Gabriel!!!

Ah sim, como não lhe bastassem os encontros mais bizarros possíveis, agora estava diante de um anjo

Tereza ficou muda, sem ação, apenas lhe estendeu a mão

__E você é... Não, não fale!!!

Como se ela pudesse esboçar alguma palavra naquele momento

__Isso, você é Tereza

Tereza passou do vermelho para o branco pálido

__Co... Como você sabe???

O rapaz riu divertidamente

__Eu estava atrás de você na fila do checkin

__Ah... sim!!! (disse Tereza balançando a cabeça convulsivamente)

__Eu, eu cheguei a pensar que você fosse um anjo, como eu sou tola não???

__Que triste!!! Então você quer dizer que não existem anjos negros???

__Ouuuuuuuuuuuu me desculpe, não foi isso que quis dizer

__Mais veja bem, você não está de todo enganada

__Ai, ai, ai, lá vamos nós. Já posso fazer a pergunta??? Ou vamos voar um pouquinho por ai enquanto penso nela???

O rapaz riu ainda mais

__Não, não, eu não sou Malak. Eu estou aqui para lhe conceder um pedido

__Ah tá então você é um gênio!!! Mais de qual lâmpada você saiu mesmo???

__Tereza, existem várias categorias de auxiliares, mais nenhum deles sobrenatural. Existem os Malak’s que trazem mensagens e tiram dúvidas, os Ledaber’s que escutam e transmitem os pedidos. Todos temos nossas vidas normais, no entanto recebemos estes chamados, que nos vem repentinos, e estamos prontamente disponíveis para executa-los

__Entendi. Mais os pedidos não são feitos via oração?

__Sim, perfeito!!! Mais no seu caso é diferente

__Diferente porque???

__Porque esta em outro nível. E esta inconsciente. Os outros não, pode observar cada um deles. Estão todos dormentes, preocupados com suas vidas. Dividas, doenças, desemprego, brigas em família, e quantas mazelas mais você possa imaginar. Os pedidos deles sempre são para sanar algum problema relativo a estas coisas de Malkut. Você Tereza, esta na busca, e estas coisas deste mundo estão deixando de fazer parte de seu objetivo. Mesmo porque, você já atingiu o objetivo da grande obra em alguns Eons, no entanto você se voluntario para o retorno afim de concretizar outro objetivo.

__E qual objetivo é esse?

__Esta resposta eu não tenho. Você deve busca-la por si só, ou aguardar o Malak respetivo a este entendimento.

__Ok, então quer dizer que eu tenho um pedido a fazer???

__Correto!!!

__Nunca fui boa com estes negócios de pedidos. Quase sempre acabo metendo os pés pelas mão e fazendo escolhas não muito interessantes

__Pela sua aura Tereza, não é bem isso que vejo

__Ah então quer dizer que até isso você consegue ver??? Que loucura, só falta você dizer que esta vendo minha roupa intima também (risos). Desculpe, desculpe, acho que passei dos limites

__Sem problemas Tereza, somos acima de tudo humanos. E não estamos imune a desejos. Só temos que equilibrar eles

__Certo. Então como nosso voo é rapidinho, que tal se tomássemos uma dose desse whisky e depois nos divertirmos rapidinho lá no banheiro do avião.

Tereza deu um sorriso muito sacana e uma leve piscada e olho. Agora quem ficou rubro foi Gabriel

__Olha, você me surpreende, a anos escutando pedidos e este foi o mais interessante que recebi

__Ah, não, não, este não é meu pedido (risos), apenas uma ideia

Gabriel tomou uma dose de whisky, se reclinou em direção a Tereza e lhe deu um caloroso beijo. Tereza ficou sem folego, olhos atônitos, tomou sua dose de whisky, abanou-se com as mãos

__Bom anjinho, vou indo na frente, te aguardo...

O avião aterrissou sem problemas em Guarulhos, o sol já ia alto, quase meio dia

__Gabriel, esta com muita pressa? Vamos almoçar aqui no aeroporto antes de irmos

__Ah sim, é uma excelente ideia, e além do mais não fez seu pedido

Tereza sorriu

O restaurante estava bem movimentado, pessoas indo e vindo, ritmo flenético. Escolheram uma mesa bem ao canto, perto da janela, onde dava para se ver a pista e os aviões indo e vindo

__Então Gabriel, é permitido saber sobre sua pessoa?

__Claro, sem problemas. Eu trabalho com arte, então estou sempre indo e vindo por estes aeroportos do mundo.

Deu um cartão a Tereza, estava escrito: Gabriel Nascimento Luz – Marchand, mais seu telefone e um site

__Olha, isso é bem interessante e conveniente. Estou pretendendo me lançar no mundo da pintura. Talvez você me seja útil

__A disposição Tereza. Quero que entenda que não é comum me relacionar com pessoas as quais e recebo “o chamado”. Se fizesse isso com frequência, minha vida se tornaria um caos. Então estou sempre focado na essência da coisa. Mesmo porque eu sou apenas um ativador do gatilho, um impulsionador. Na vida as pessoas recebem muitos destes gatilhos, mais quase sempre não estão atentas e o momento passa despercebido. Alguém que se encontra na rua, alguém que um dia já trabalhou com você. São pessoas que passam por você quase que despercebidas. Elas lhe dão uma deixa, uma ideia, mais se sua dormência for muito grande e latente. As oportunidades vão passando. E tanta gente lamenta, não ter tido oportunidades na vida, quando simplesmente elas passaram a sua frente. Mais não se deram conta, pois estavam focadas em coisas banais ou problemas que não conseguiu solucionar, ou não queriam, ficavam protelando

__Sim Gabriel isso é a pura verdade. De uns tempos para cá, ando resolvendo muita coisa que estava atulhada. Relacionamento abusivo, trabalho fora de perfil, problemas em família. E se parar para pensar ainda acho mais. (risos)

Os dois conversaram sobre coisas diversas e os minutos voaram rapidamente, o celular de Gabriel tocou e ele atendeu

__Tereza, hora de ir!!!

__Ah, sim, vamos então ao pedido. Uma vez um rapaz pediu sabedoria para o Pai, na verdade ele já foi sábio em fazer este pedido. De forma que o meu pedido é este: sabedoria e discernimento para seguir o caminho e poder ajudar meu próximo.

__Perfeito Tereza, não esperava coisa diferente de você. Como disse antes isso aqui foi apenas um gatilho, ou se quiser, um treino. A grande sacada é pedir coisas de coração, se for com a própria voz é ótimo, mais um bom pensamento também é válido. O pedido não pode ser para si mesmo, deve ser para outro não importando se no final você irá se beneficiar também. Lembre-se sempre que os caminhos são de mão-dupla, eles vão, mais com certeza também retornam.

Na porta do aeroporto, se despediram, deram um último beijo, longo e quente. Cada um entrou em seu taxi e partiram para destinos diferentes


sexta-feira, 21 de agosto de 2020

O Oitavo Encontro

Tereza acabava de entrar em casa com suas compras quando seu celular tocou diversas vezes.

Era sua irmã Paola...

Sentiu de imediato um frio que lhe transpassou o corpo, da cabeça aos pés

Já fazia anos que não se falavam (brigas familiares)

A notícia, seu sobrinho Pedro havia falecido...

Foi tomada por uma profunda tristeza, chorou copiosamente, por horas

Sua irmã tinha se mudado há uns cinco anos para cidade do Rio de Janeiro, mais velha de todos, decidiu tomar o rumo em sua vida, pegou o filho único pela mão e sem dar satisfações a resto da família simplesmente partiu em uma manhã fria de julho

Tereza se pôs a fazer as malas pois cabia ali um último adeus, se bem que não era muito de ir a enterros, mais precisava de fato pôr um fim a mais um capítulo de sua existência. Fazer as pazes com a irmã e ver uma última vez o sobrinho amado.

Na fila do chek in parecia um zumbi, não tinha a percepção das pessoas a sua volta, estava totalmente interiorizada, a mente estava pesada, prestes a explodir. Tomou seu acento no avião... a mente vagou

Revia a briga horrível que teve com sua irmã (a última delas). Por conta do pai do sobrinho. Uma amiga de sua irmã tinha plantado uma semente amarga sobre uma possível relação entre ela e o cunhado. Foi tudo em uma tarde de novembro, Tereza está no shopping fazendo as compras de natal, lembra-se que comprar um DVD de games para o sobrinho. Estava muito feliz, foi tomar um café na praça de alimentação quando encontrou Pedro, que por sinal estava muito contente também, primeiro dia de férias. Ele a convidou para o acento na mesma mesa. Foi algo normal e inocente, lancharam, conversaram quando um improvável celular fez uma foto e uma postagem indiscreta...

Quando chegou em casa a briga foi horrível, sua irmã já a horas já atormentava sua mãe falando do encontro dos dois e o quanto eram safados, o pequeno Pedro chorava aos berros, pois amava a todos intensamente. Paola então começou a xinga-la de todos os nomes baixos possíveis e imagináveis, chegou a avançar sobre sua face fazendo um arranhão horrível que lhe deixou uma bela cicatriz por dentro e por fora. No outro dia quando acordaram deram pela sua falta, mais o menino. Novo choro da mãe que culpou Tereza até o fim de sua vida, expulsando a mesma de casa.

Chegando agora ao velório de Pedro, sua irmã foi a seu encontro banhada em lágrimas. A abraçou fortemente, milhares de pedidos de perdão, Tereza nada falou...

Foi ao caixão do sobrinho, estava lindo, 19 anos, um rapaz, ao lado uma foto sua ainda criança, da idade a qual o tinha visto pela última vez

Um filme passou em sua cabeça, de quanto aquela criança sofrera, ela nunca fora amada o suficiente. Um nascimento não programado, Paola via-o como um empecilho em sua relação com o Pai. Pois assim que a criança nascera acabaram se os teatros noturnos, a vida boemia de que tanto gostava, tinha aversão a trocar fraudas (repulsa), o pai é quem fazia tudo isso com um grande desgosto pela forma de como ela agia. Era realmente uma mãe atípica. O pai via as famílias no bairro, encontros de famílias, almoços, festas, mais Paola era mesmo da badalação. Tomou então o hábito de ter más amizades e trazia sempre para casa pessoas estranhas que ficavam bebendo até tarde, tinha até desconfiança que usavam drogas. Suas redes sócias eram repletas de fotos com o copo na mão, roupas sexys e amigas extravagantes.

Como os pais trabalhavam passava boa parte do dia dom a avó e os tios, mais era com Tereza que ele mais se abria, desde de a tenra idade. Praticamente via na avó e na tia a mãe que sempre quis ter, eram tarde memoráveis, de brincadeira, lanches, filmes e passeios.

Foi então que Paola foi demitida e as coisa se complicaram, com a grana pouca não tinha mais como sustentar sua vida e vícios. Passou a culpar o marido por ser um fracassado na vida profissional e ganhar tão pouco, e o filho de que não passava de um fardo o qual tinha que carregar

Proibiu então o pequeno Pedro de ficar na casa da avó, culpou-a de mimar muito a criança, dizendo que ela precisava ser doutrinada. Logo em seguida veio o episódio da briga das irmãs

Paola tinha uma amiga que estava de retorno para o Rio, com promessa de emprego com ganhos altos, não pensou duas vezes. Nunca ninguém soube que empego era esse, no entanto lhe deu uma vida confortável, no qual podia pagar um apartamento em Leblon e ter a vida que tanto gostava (fútil).

Tereza se sentou em silencio ao lado de Paola, que narrou os últimos acontecimentos:

Pedro se envolveu com uns garotos maus da alta sociedade, e começou a beber e usar drogas precocemente, nada disso sua mãe percebia (apesar dos alertas da vizinhança), só estava tranquila por saber que ele tinha amigos e estava sempre sorrido. Suas idas até a faculdade estavam ficando muito raras, mais Paola nem se apercebeu disso, pois não tinha tempo, ficavam quase sempre sabendo por ligações de professores e amigos, o pai de Pedro havia refeito a vida casado novamente e tido uma filha, chegou mesmo a fazer vários convites para o filho ir morar com ele, todos em vão. Até que o fatídico dia chegou, Paola foi acordada por barulhos de sirenes, era a Polícia, seu filho tinha se envolvido em um acidente de carro e a morte foi fatal.

Paola pedia perdão convulsivamente e gritava alto: o que vou fazer agora da minha vida, não tenho ninguém?

__ E seus amigos Paola, onde estão

__ Não vieram, nenhum deles! Acho que estou acordando agora de um sono profundo

__ E Pedro não veio ao velório do filho porquê?

__ Foi promovido, está nos Estados Unidos

__ Entendo...

__ Você tem dinheiro para ir tocando adiante?

__ Sim, sim tenho, consegui um bom emprego quando vi para cá. Mas vejo que isso de nada valeu. Acho que preferia estar com minha vidinha simples e feliz que tinha anteriormente sabe! Uma família

Colocou as mãos no rosto e voltou a chorar muito

Tereza pensou, pensou muito

__ Veja Paolo, eu ti perdoo, porque todos merecem o perdão. Minha casa está com as portas abertas para você. Parece-me que você ainda tem laços por aqui. Mais se um dia esses laços se romperem, pode retornar. Tente apenas se reconstruir, mais de um modo diferente. Até a data de hoje você viveu apenas para você mesma. Mas veja, a vida é uma comunhão onde todos estamos conectados, onde uns precisam dos outros. Com exceção de alguns mestres que conseguem seguir por si mesmos. Você simplesmente via seu lado, não procurou saber de Pedro, de Pedrinho, da mãe, de mim e dos outros irmãos, atropelou a todos com sua arrogância e pretensão. Mais enfim nada do que se passou tem um concerto ou retorno, deves plantar sementes novas, novos frutos. Eu parto de volta hoje é tão eternomesmo, mais fica aqui o meu número e sempre que precisares é só entrar em contato

__ Tereza você está tão diferente, parece tão mais segura, que parece que você é a irmã mais velha! Sim vou seguir seus conselhos e tentar seguir adiante

Chegado o momento o caixão foi transportado a seu destino final. Tereza teve que improvisar uns dois funcionários da funerária para ajudar a carregar a urna, dois amigos da faculdade de Pedro compareceram. O enterro foi triste e frio, Paola caiu de joelhos e terra e as lagrimas inundaram a terra ressequida. Tereza ponderava sobre que uma pessoa podia fazer consigo mesma e ainda atingir inocentes. Quantas e quantas Paolas não estão por ai no mundo fazendo sofrer pequenos e grandes Pedros.

Na porta do cemitério uma última despedida, um abraço silencioso, Tereza sinalizou para um taxi e partiu, essa seria a derradeira vez que veria sua irmã mais velha...

sábado, 18 de julho de 2020

O Sétimo Encontro

Teresa estava exausta!!! Tomou um banho longo e quente. Quando saiu do chuveiro sua pele exalava vapor e um tênue aroma adocicado. Resolve fazer então algo que não fazia a anos.... Dormir totalmente nua e sem nenhuma coberta, visto que, a noite estava levemente quente. Fez uma oração ao Pai, e uma a Mãe. Já fazia muito tempo que não elevava seus pensamentos a Mãe. Lembrou-se de sua infância, que às vezes ao deitar morria de medo, e tinha que se cobrir até a cabeça e pedir proteção a Mãe. Então sentia uma paz imensa e lhe vinha um sono tranquilo. Não sabia porque, mais a muito tempo não falava com a Mãe. Recostou a cabeça no travesseiro e dormiu longamente...
Despertou com o alarme de seu celular, era seis horas da manhã, que tristeza, era segunda-feira. Mais vestiu-se logo de alegria, mesmo estando nua, pois tinha saúde e era dona de si mesma.... Não tanto, por um pequeno detalhe, que iria resolver naquele dia mesmo. Levantou-se, tomou um banho rápido, vestiu-se toda de preto e fez uma maquiagem no mesmo estilo, deu beijo para seu reflexo no espelho e foi para o mundo
Teresa chegou como sempre, pontualmente as oito e vinte e cinco, seu horário de entrada era as nove, então ganhava sempre uns minutos extras, para tomar um café, conversar com alguém ou mesmo ir ao banheiro. Ela trabalhava já a alguns anos nessa empresa de cobranças, era uma das melhores e uma das mais cobradas, por ironia, também era uma das mais relegadas. Na verdade, a sua líder tinha uma inveja muito grande da pessoa que ela era, extremamente competente, eficaz, simpática, amiga de todos, inclusive dela. No entanto o medo de Teresa se sobressair e ser motivo de destaque na operação, fazia com que Solange sempre pegasse no seu pé e vivesse reclamando de coisa pequenas e sem sentido: “Tereza hoje preciso de você, irá ficar uma hora a mais” (na verdade seriam duas ou mais, e sempre era Tereza que se estendia, quando ela mesmo ia embora deixando tudo a seu cargo. Muitas vezes quando outras pessoas erravam, a culpa caia justamente nela, mesmo tentando explicar e se justificar, tudo inútil: “Tereza você é a mais antiga de casa, deveria ter orientado melhor ela, se houve este erro, a culpa é sua”.
Assim que entrou no escritório houve um silêncio profundo e constrangedor. Todos pararam o que estavam fazendo e por rápidos minutos fitaram sua pessoa. Até que Paulo, um rapaz que se sentava ao fundo e era o mais descolado da equipe, se levantou e deu um grito:
__Tereza, você está fantástica!!!
Paulo começou a bater palmas e a coisa meio que fugiu do controle, a operação toda se levantou e começou a aplaudir Tereza, ela deu um sorriso constrangido. Do meio da sala pode se ouvir uma voz autoritária e em tom arrogante.
__Ok, ok queridos, o circo já passou agora voltem todos a seus afazeres. E você mocinha está fora dos padrões da empresa. Que trajes são esses??? E pelo amor.... Que maquiagem horrível é essa???
__Solange não vim aqui falar do meu estilo novo e arrojado, que realmente não combina mais com este lugar. Este lugar, tirando claro, muitos de meus amigos que não merecem estar aqui, é triste e deprimente, bem a sua cara
Solange ficou lívida, tentou falar, mais apenas gaguejos lhe saiam pela boca. Ao redor várias reações: risinhos, comentários reprovativos, alguns sorrisos de concordância
__Eu vim para me despedir de vocês. Passei no RH e pedi minhas contas. Portanto o contato que terão comigo, provavelmente será pelas redes sociais
Tereza ouviu um leve choro vindo de uma das mesas, era sua melhor amiga de trabalho, se dirigiu até ela, abriu os braços e lhe deu um forte abraço
__Você não, minha casa está com as portas abertas, venha sempre que quiser!!! E faça algo por você também. Saia desta vida!!!
Como era de sua nova pessoa, deu as costas e foi embora. Agora tudo aquilo também era passado. Pegou o elevador e na recepção se despediu dos atendentes que sempre lhe foram tão simpáticos e solícitos, trocaram telefones. Tereza alcançou a frente do prédio, era um lindo dia nublado, respirou profundamente aquele ar, era um novo ar. Lembrou-se que ali nas proximidades havia uma loja de produtos de artes, ficava na Galeria Metrópole, ainda era um pouco cedo, mais o ambiente lá era bem acolhedor, se dirigiu ao endereço, subiu dois lances de escada rolante, sentou-se em um dos bancos, abriu a bolsa, ia pegar o tablete e dar sequência na leitura do livro, quando alguém lhe chamou:
__Oi Lucia
Tereza simplesmente congelou, um arrepio tomou conta de todo se corpo. A criança a seu lado dava um lindo sorriso
__Amanda???
__Ainda bem que você se lembrou de mim, já estava ficando chato não ser reconhecida
__Como você chegou aqui???
__Ah, simples, você me chamou, e aqui eu estou
__Não, eu não chamei você!!!
__Chamou sim, ontem à noite, antes de você ir se deitar
Tereza pensou, pensou, mais não atinou!!!
__Antigamente, nós erámos muito mais próximas e eu adorava ficar com você, pois você não era como as outras pessoas, que ficavam somente me pedindo coisas. Você sempre pura e sincera. Mais com o tempo você cresceu e nossa amizade meio que ficou no vácuo (um sorriso)
Tereza fez uma cara de espanto, sim claro, agora se lembrava, e como uma novela, cenas se passaram em sua mente: de quando caiu da bicicleta e teve o braço quebrado, ficou dias sem sair de casa, mais a oração que sua mãe lhe ensinará lhe deu extremo alívio e uma companhia para brincar e não ficar só. Então toda vez que sofria algum descontentamento, fosse na escola ou em casa, sua amiga Lucia vinha brincar e conversar com ela. Seus pais quando souberam de Lucia, ficaram preocupados com Tereza, foram aí que começaram as primeiras sessões com o terapeuta, e com resultados e o tempo Lucia sumiu de sua vida, como se fosse uma imaginação de sua mente. Mais como ela estava ali agora, e o tempo lhe manterá da mesma forma. Tereza pegou nas mãos de Lucia
__Como você pode existir? Não entendo
__Eu sou o fruto da sua imaginação, mais isso não quer dizer que não exista. Você como uma pessoa do Segundo Plano pode me ver facilmente, sempre que quiser. Você me chama Mãe, como a sua própria lhe ensinou, outros me chamam de Maria, mais eu prefiro Lucia (o sorriso, sempre no rosto)
Tereza chorou muito...
__Maria foi uma pessoa que existiu há muitos e muitos anos, eu não sou ela, eu fui ela. Isso já se passou. Eu tive um privilégio que me foi dado. E hoje as pessoas se enganam achando que eu tenho o poder. O poder é de todos aqueles que acendem. Você tem o poder!!!
Lucia encostou o dedo no peito de Tereza, lhe indicando o coração
__É errado pedir aos Santos!!! Pois isso só retarda a fé!!! Recebo milhões de pedidos, tenho que mentaliza-los e envia-los ao Pai. Se as pessoas tivessem fé nele suas orações iriam direto a ele, tal qual a luz chega a Terra
__Entendo, ele é o Pai e você a Mãe!!!
__Não Tereza, o Pai e a Mãe são a mesma energia de gêneros diferentes, não é um contexto sexual, mais um contexto harmônico. Imagine uma linha, se você seguir para um lado tem o Pai, se seguir na direção oposta, tem a Mãe. Vai depender muito do que você procurar, e o momento em que você estiver inserida. Mais o mais importante é que você tem Eles dentro de si. É uma centelha, e você já emana essa energia! Precisa completar sua missão e descobrir seu nome cósmico
__Como assim, não entendo?
__Moça você está bem?
Olhou para o lado, um rapaz lhe tocava o braço, voltou sua atenção para Lucia, mais esta já não estava mais lá
__Você estava falando sozinha moça, tá tudo bem? Estava esperando a loja abrir?
Tereza acenou com a cabeça que sim, se levantou e ficou esperando o rapaz abrir a loja de artes

sexta-feira, 12 de junho de 2020

O Sexto Encontro

Tereza era do tipo de pessoa que se impressionava muito com as coisas, no entanto, de uns tempos para cá, desde o encontro com o misterioso passageiro do ônibus, as coisas foram tomando uma forma normal, e ela própria se espantava de tal coisa. Até mesmo o encontro com a garotinha no parque, apesar de lhe ter espantado a principio, depois lhe pareceu normal. Afinal, a vida não era assim mesmo, cheio de surpresas? Uma hora você esta aqui fazendo mil coisas e do nada estas coisas são removidas e você passa a estar em outro lugar, em outro tipo de situação. Aliás por falar em situações, repentinamente Tereza foi tomada por uma forte determinação, pegou o celular e ligou para seu namorado marcando um encontro para aquela tarde!
Foi para casa, abriu o guarda-roupas para escolher a roupa do encontro, mais estranhamente, nada lhe satisfazia, pensou e pensou: o encontro será em um shopping porque não comprar algo novo, bem que estou merecendo, pegou a bolsa e saiu com a roupa do corpo.
Descidiu que iria de trêm, afinal sua casa era a alguns quarteirões da estação, e sábado o movimento era bem pequeno. Chegando na estação sentou no banco na espera do próximo coletivo. Se sentia um tanto quanto estranha, parecia aqueles mutantes dos filmes, outro ataque de risos a acometeu, e as pessoas em sua volta pararam para fita-la. Estranhamente estava com seus sentidos muito aguçados, conseguia ouvir as conversas paralelas, sentir o cheiro do queijo de um croassant da padaria próxima a estação, as cores das coisas estavam muito mais vivídas. O que seria aquilo tudo???
Entrou no trêm, recostou a cabeça no vidro, e enquanto as pessoas da plataforma passavam rapidamente, acabou por adormecer, e uma voz...
__Lucia, pare de mentir para si mesma e desperta, à vivida vida te espera no limiar da existência.
__É agora que lhe faço a pergunta???
__Sim Lucia, bem agora!!!
__Você me disse que não era daqui. E de onde eu sou???
__ Você é uma pessoa do Reino!!! Mais escolheu retornar porque acredita ainda nas pessoas. Mais os Mestres já fizeram esse trabalho árduo. E você mesmo assim se candidatou...
__ Me candidatei a que???
__ Como assim ao que??? Ao resgaste!!! Observe todos, estão ainda dormindo, acreditam que realmente este é o mundo verdadeiro, mais não é. Poucas pessoas sabem disso, você é uma delas. Mais você também se esqueceu. Foi até o Mnemósine e tomou uma grande quantidade de sua água, para quando sorvesse as aguas λήθη, nada lhe aconteceria, no entanto, você sofreu uma espécie de dormência agora transita entre as duas dimensões. Seu despertar é bem lento, já devia ter acordado a muito tempo.
__ Se este não é o mundo verdadeiro, onde eu estou???
__ Próxima estação, Tatuapé
__Como???
Seus olhos foram abrindo lentamente e quando se deu conta, deveria descer na próxima estação. Levantou-se rapidamente, arrumou os cabelos com as mãos. Aguardou a parada na estação e desceu. Enquanto subia a escada rolante, foi meditando seu sonho, assimilando, colhendo as partes mais importantes
Ao entrar no shopping a primeira loja que procurou foi uma de bolsas, procurou uma mediana, de cor preta, depois sentou em um dos bancos do shopping e tirou as coisas mais importantes que tinha na bolsa e passou para a outra: documentos, o tablet, absorvente. E jogou fora a bolsa antiga com a foto do namorado dentro dela, alguns poemas que ele tinha feito, e um monte de coisas do passado...
Em frente ao banco tinha um salão de beleza, entrou, não estava tão cheio, tinha uma garota sentanda com as mãos no queixo
__ O que foi meu bem???
__ Nada não, é que sou novata aqui então não me deixam fazer nada, apenas observar e observar, isso vai me entediando, entende???
__ Ah mais se não colocar as mãos a obra nunca vai conseguir nada, não é??? (deu uma piscadela à garota)
__Sim claro! (um enorme sorriso saiu de sua face)
__Qual seu nome meu bem???
__ Julia
__ Pois bem Julia, hoje é a estreia de uma grande profissional, não se decepcione heim???
__ E o que você vai querer
__ Me surpreenda!!!
A dona do salão olhou meio de lado, mais como viu que elas estavam se entendendo não falou nada, afinal o importante era o dinheiro no caixa.
Julia pegou a tesoura e imaginou o que cairiam bem para o desenho do rosto de Tereza, então passou a ferramenta em seus cabelos com movimentos ágeis e precisos, a coisa levou em torno de 30 a 40 minutos. Seus cabelos eram castanhos por natureza, então ela deixou sobre eles uma tintura preta que deu um tom forte com brilho. Juliu olhou Tereza pelo reflexo no espelho, tinha um sorriso imenso, e lhe perguntou:
__ Posso fazer a Make também?
__ Claro meu anjo, hoje é seu dia...
Julia passou mais alguns minutos entre tons pretos e cinzas quando finalmente terminou.
__ Tereza, acabei, espero que goste
Ela se fitou no espelho. Foi tomada por um grande espanto. A pessoa ali no espelho não era ela. Estava totalmente exótica, meio gótica, meio bruxa, ou porque não os dois...
__ Está maravilhoso Julia, mês que vem vou querer repetir (risos), me veja a conta por favor que as horas voam como uma bruxa (mais risos, nem sabia porque dissera aquilo)
Pagou o valor do serviço, deu uma gorjeta polpuda para a garotinha e na saída, saiu com essa?
__ Dona trate muito bem essa garota, pois ela é um grande talento. E um dia será dona deste salão
Virou as costas e saiu, sem poder ver a cara de horror da madame do estabelecimento. Foi em direção a uma loja de roupas e escolheu um estilo que cabia com seu novo cabelo, make e bolsa. Pagou e entrou no banheiro do shopping para se trocar, separou as roupas antigas e colocou nas sacolas da loja, na saída deixaria com algumas destas pessoas que ficam pedindo caridade ali pelas redondezas. Parou em frente ao espelho do banheiro e fez uma foto, botou no seu status e no seu instagram. Enquanto colocava o celular na bolsa sua nova foto explodia de visualizações.
Se dirigiu até a praça de alimentações onde iria encontrar seu namorado, ele já a guardava lá à horas. E todo enfezadinho já foi para a agressividade
__ Bonito heim, estou a horas aqui lhe aguardando
__ Bonito é sua educação (risos)
Ele parou por uns minutos e ficou analisando ela...
__ Uau heim, você está ótima, o que aconteceu
__ Liberdade, simplesmente!!!
__ Como assim???
__ Vim aqui apenas pedir minha demissão como sua escrava (risos)
__ Esta saindo com outro? Olha que se souber de algo lhe mato viu (estava furioso)
__ Você não pode matar o que não é seu, simplesmente isso
E assim como fizera na loja, virou as costas e foi embora. Se sentia extremamente forte e ousada!!! Só conseguia ouvir ao longe seus gritos selvagens (também não pode ver, que ele fez menção de lhe atacar por traz, mais alguns seguranças que estava por perto o contiveram e seguraram ele até ela sair do shopping. Agora Tereza tinha ativado sem saber seu modo de alto defesa e ninguém, mais ninguém no mundo teria o poder de lhe fazer mal algum. O alto escalão estava atento, fora convocado para sua defesa e os exércitos invisíveis estavam a sua disposição...

quarta-feira, 13 de maio de 2020

O Quinto Encontro

Como decidira tirar o dia para si mesma resolveu então fazer algo diferente e foi até um museu de antiguidades. Passou bem dizer o resto do dia por lá, observando as obras e imaginando como as pessoas viviam em tempos passados, imaginou-se até, sendo uma destas pessoas, quando enfim se cansou e resolveu dar por encerrada aquela excursão.
Ao chegar em casa Tereza tomou um banho prolongado, deixando apenas a água quente do chuveiro cair sobre sua cabeça e escorrer pelo seu corpo, fazendo uma meditação de alguns minutos, tentando esvaziar sua cabeça de tudo aquilo. Se enrolou na toalha e foi para seu quarto. Mirou-se no espelho e disse: Faça a pergunta!!! Deu um largo sorriso, pegou seu moletom na gaveta do guarda-roupas e se vestiu. Desceu as escadas e sentou-se no sofá, como estava muito frio colocou um fino cobertor sobre si. Estava sem um pingo de fome, pegou o tablete para ler o livro que havia comprado no dia anterior.
Na capa o símbolo estranho, leu a introdução:
                "A 'Cruz da Serpente', 'Cruz de Flamel', ou ainda apenas 'Flamel', é um símbolo místico alquímico descrito como uma cruz com uma cobra ou serpente envolvida, bem como asas destacadas e uma coroa acima delas.
             Esse símbolo assemelha-se e compartilha origens comuns com muitos outros símbolos antigos (com os quais é às vezes confundido), como a ‘Haste de Asclépio’, o antigo símbolo grego da medicina, o “Caduceu”, antigo símbolo grego relacionado ao deus Hermes, e o ‘Nehushtan’, um símbolo hebreu que significa a vitória sobre o diabo. Ele é também um dos símbolos atribuídos ao alquimista francês Nicolas Flamel. A cruz aparece nas ilustrações de Flamel e muitos dizem simbolizar a relação dele com a ‘Pedra Filosofal’, um artefato cheio de mistérios e que, segundo a crença, levaria seu possuidor a ter uma vida muito longa.”
Tereza então fitou a imagem daquele símbolo no livro e a observar todos os seus detalhes, e uma forte sonolência se apoderou dela, acordou assustada, pegou o tablete e viu que já era nove horas da manhã. Entrou em pânico, estava atrasadíssima para o trabalho. Subiu as escadas praticamente saltando os degraus, chegou ao andar superior ofegante, tomou folego e refletiu. Foi a seu quarto, pegou o celular e observou ele por instantes. Deu uma grande e sonora gargalhada. Que estupida eu sou!!! Hoje é sábado... Trocou de roupa, pegou algum dinheiro e foi até a padaria para comprar algo para o café da manhã
No caminho até a padaria resolveu passar por um parque que havia em seu bairro. O sol já despontava firme, forte e quente, respirou aquele a ar da manhã, o cheiro das árvores lhe agradava imensamente. Sentou em um banco da praça e ficou apreciando os pássaros cantando.
__Ei Lucia
Tereza olhou para o lado e viu uma garotinha que deveria ter, mais ou menos uns nove anos de idade
__Olá, eu sou Tereza
__ Não é não!!! Você é Lucia, me lembro bem de você. Você não é daqui!!!
Tereza sorriu
__Ok!!! E qual seu nome???
__Me chamo Amanda. Lucia você devia parar de mentir viu!!!
Tereza ficou confusa, ou será que confusa estava a garotinha. Ela tinha um olhar sério, sisudo
__Como assim???
__Você sempre teve este defeito Lucia, de mentir para si mesma. E isso lhe faz muito mal
__Garotinha, você é de onde??? Onde estão seus pais???
Tereza se lembrou que tinha umas balas na bolsa e abriu para pega-las para a garotinha, fazia isso enquanto falava. Quando se dirigiu a garotinha, ela não estava mais lá!!! Seu coração disparou, levantou-se e olhava para todos os lados, tentando achar aquela menina, que ainda pouco estava ali conversando com ela, mas nada!!! O parque todo foi tomado por um estranho silêncio, os passarinhos não mais cantavam, o vento não mais crispava nas folhas das árvores. Tereza saiu do parque a passos rápidos, a cabeça latejava. Melhor seria dirigir-se a padaria, ainda estava em jejum, comprar algo para comer, e assimilar com calma mais aquele evento

sexta-feira, 17 de abril de 2020

O Quarto Encontro

Ao sair do consultório sentia-se extremamente leve e calma, já até esquecera o número do andar e da sala. Entrou no elevador com um sorriso imenso. Olhou seu reflexo no espelho e disse: Qual a sua pergunta???
Caiu em uma crise de risos incontrolável, as pessoas que iam entrando olhavam para ela de uma forma estranha, quase bizarra, o que somente lhe alimentava mais ainda os risos. Quando o elevador chegou ao térreo esperou todos descerem, se dirigiu a recepção e devolveu o crachá de visitante, deu um imenso sorriso a recepcionista e lhe disse:
__Querida, tenha uma excelente semana!!!
__Obrigada...
Assim que pôs os pés na rua a recepcionista comentou com segurança:
__Esse psicólogo ai do 13 deve ser bom mesmo (risos). Todas suas pacientes saem rindo muito de lá. Acho que vou marcar uma consulta para mim também.
O segurança lhe respondeu com um sorriso e se dirigiu a porta para observar a rua. Lá fora a vida seguia como sempre em sua rotina incessante, de pessoas indo e vindo, sempre com pressa, como se tivessem sempre perdido algo e nunca encontrando. O barulho e a poluição formavam um ambiente de tormenta, de caos. Menos para algumas pessoas que internamente viviam em um mundo particular de paz absoluta. Neste mundo se encontrava agora Tereza, que se dirigiu a um ponto de ônibus para pegar o coletivo e ir para o serviço, quando ouviu alguém sussurrar
__Hei moça...
Olhou para trás, era um mendigo com a mão estendida. Observou os arredores, abriu sua bolsa e pegou algumas moedas que colocou na mão do mendigo
__Deus lhe abençoe moça
Ela se limitou a fazer um gesto positivo com a cabeço
__Moça, faça a sua pergunta!!!
Tereza ficou imóvel!!! Um arrepio lhe subiu pelo corpo e os pelos ficaram em pé, seu ônibus chegou, parou, partiu e ela nem se deu conta. Não sabia se olhava novamente para o mendigo, ou simplesmente lhe ignorava e seguia a vida. Aquilo não podia estar acontecendo, devia ser algum tipo de coincidência é claro. Olhou lentamente para o mendigo, que agora lhe sorria com os poucos dentes que tinha na boca
__Moça, não existem coincidências. Isso são justificativas para pessoas de pouca fé!!!
__Você deve estar com fome, não é??? Posso lhe pagar um lanche???
__Claro moça. Agradeço lhe e muito.
__Quando cheguei hoje cedo passei em uma lanchonete na esquina desta rua, vamos até lá.
O mendigo se levantou e seguiu a moça até a lanchonete, ao chegar no estabelecimento a moça foi entrando, no entanto o mendigo foi barrado por um funcionário que varria o chão.
__Aqui você não entra!!!
__Rapaz, ele esta comigo... É meu primo
O funcionário analisou os dois, balançou a cabeça negativamente e respondeu
__Por favor vão até o fundo, tem uma mesa próxima ao banheiro, fiquem por lá que já irei atender vocês
__Obrigada
Tereza entrou com o mendigo e sentaram-se a mesa
__Quer dizer que agora eu sou seu primo? (risos)
__Melhor assim. Evita-se muitas perguntas. Aliás qual seu nome?
__Me chamam Jesus
Tereza olhou com estranhecimento
__Ok Jesus, porque você fez aquela pergunta para mim?
__Moça, me perdoe tá, eu sou um homem estranho, as vezes falo o que sinto vontade, simplesmente isso, ou quando não falo eu escrevo. Jesus então abriu um bolsa que tinha pendurada no pescoço e tirou um monte de folhas escritas.
__Veja você mesma
Tereza pegou as folhas e olhou-as uma a uma. Estava em sua maioria muitos sujas e encardias, algumas até com manchas de gordura. Uma das folhas lhe chamou a atenção, tinha um título: Carta ao Alquimista.
__Jesus, posso ficar com esta???
__Claro moça.
__Obrigada, aliás, me chamo Tereza
__Tá certo Tereza
__Bom Quanto a pergunta. O que é o Retorno?
__Simples, quando se vai, tem que voltar, isso é um retorno
Tereza olhou boquiaberta, pois não esperava uma resposta assim tão rápida e sem gaguejar
__Perfeito, no entanto, o Retorno de onde?
__Tereza infelizmente não tenho todas as respostas para suas perguntas. As vezes meu cérebro trabalha rápido e já tenho algo em mente para disparar. As vezes tenho uns vazio e nem me lembro quem sou, nem onde estou. As vezes... As coisas me vem em sonhos confusos, às vezes acho que vou enlouquecer.
Jesus colocou as mão sobre o rosto e começou a chorar copiosamente. Tereza sentiu uma imensa vontade de abraçar aquele ser humano, e foi o que fez. Foi então que se deu um fato. Ela sentiu algo sair de dentro de si e na sequência recebeu algo em troca. Ela não sentia o fétido odor daquele homem, o abraço foi algo despretensioso e inimaginável. Ela se sentia outra pessoa, a Tereza do dia seguinte jamais teria conseguido fazer aquele gesto. Quando Jesus levantou a cabeça estava radiante. Tereza lhe sorriu de volta e entregou nas mãos daquele homem a suposta receita do Psicologo.
__Fica para você Jesus, é uma receita médica. E toda vez que tiveres duvidas a use, e não chores mais, pois és abençoado. Quando não precisares mais desta receita. Passa ela adiante, pois com certeza alguém vai precisar.
Novamente aquilo... Estava falando palavras que não eram suas. De onde saiu tudo aquilo!!!
No fim daquela manhã, mais dois desconhecidos estavam felizes. Sairam da lanchonete, Jesus foi para direita e Tereza para esquerda, em direção ao ponto de ônibus, estava decidida a ir para casa e encerrar aquele dia. Acenou para Jesus que se perdeu na multidão, ao retornar a atenção viu que seu ônibus acabar de parar, sem nem mesmo ela dar o sinal. Subiu as escadas, cumprimentou o motorista, estava leve. Foi ao fundo do coletivo e sentou-se, abriu a bolsa e sacou o texto de Jesus, leu e passou a refletir:

“Carta ao Alquimista

Acorda criatura!
E desperta o Deus que a em ti!
A centelha adormecida
Que mora contigo debaixo da telha
Urge que largues o material e carnal
Para abrir-te os olhos ao que esta mais além
Teu pai te chama, ti reclama, e tu não ouves!
Abre os ouvidos e ouve
O que é inaudível ao ser comum...
Escutas com dom da alma!
Olhe com olhos sem cobiça
E larga de vez o que te atiça
Que a bem-aventurança está em ti!”